E aventura destemida, de cawboys em grupo ou solitários, corajosos ou cheios de medo, espelhando as verdadeiras feições humanas, foi o que eu vi a par da ganância, da inveja, da riqueza, da miséria e pobreza. O ensejo de fixação à terra, um palmo de terra que seja, o cansaço de ser andarilho, salteador de bancos e o desejo de com o produto do roubo adquirir um qualquer rancho e nele, bandoleiro que foi, se transformar num homem novo laborioso e honrado. O cansaço de jogatinas de casino e repouso numa cadeira de balouço, sem necessidade de sacar o revólver e disparar para não ser morto. As manadas de cavalos e de vacas a atravessarem quilómetros para serem abatidas ou a reproduzirem a espécie num qualquer rancho de vaqueiro já feito a a fazer. O obstáculo dos rios. Os saloons a tresandarem a álcool, sexo e tiroteio cerrado por dá cá aquela palha, ou ajuste de contas de negócios anteriores mal resolvidos.
Sonhos de velhos, novos, homens, mulheres e crianças a deslocam-se por vales, planícies e montanhas, em carros, carretas ou montados em selas cilhadas em fogosos cavalos. Os mustangs e os appaloosas de militares ou de cowboys espelham a mestiçagem de gente e bichos. Zaragata e murros em barda, pois americano que se preza, esmurra, espanca e reza. É a América a nascer. Os americanos a conquistarem as terras e os índios a perdê-las. O chapéu alto de janota, jogador de cartas, aba levantada, distingue-se claramente do chapéu de palha do mexicano de aba caída sobre orelhas e rosto. A astúcia, a verdade, a mentira e a ingenuidade, a boa e a má fé deslizam rua abaixo e rua acima ao gosto de cada um. Por todo o lado impera a lei do mais astuto, do pai e do filho, do mais esperto e mais rápido no gatilho. E mesmo em cidades que se reclamam de "LEI E ORDEM", a vida e a morte estão no fio da navalha, nas mãos do banqueiro ganancioso e do xerife corrupto, alguns deles ex-membros de gangue salteador de comboios e caravanas. Não faltam cadeias e forcas. Pianos e prostitutas. Igrejas e cangalheiros. Coragem e bazófia. Gente de paz e bandoleiros. Estábulos onde o macho cobre a fêmea e o homem faz sexo com a mulher em concluio amoroso ou encontro fortuíto. uma relação estreita com a natureza. Ontem, hoje e sempre, no oeste, no este, em todo o lado. Aquela criança a dizer ingenuamente que o vaqueiro cheira a bode. A senhora a perguntar a outro vaqueiro quantas vezes toma banho. Resposta pronta: «sei lá, três ou quatro». Por mês? «Não, por ano». E enumera as vezes que necessita de fazê-lo. As máquinas a vapor, paradas nas estações resfolgam como que ganhando fôlego para deslizarem nos carris, levando gente, armas e barris. Água corre nos rios e nas fontes. Nos bares e salooms corre, para todos, wísque a rodos.
Não vou referir nomes, mas pelo écran da minha televisão desfilaram os artistas e as artistas que dispensam apresentação, todos cuja arte eu projectei na tela de cinema há muitos anos. Eram jovens quando eu era jovem. Lúcido e informado, ciente estive de que, por algumas horas, convivi com mortos, pois mortos são a maioria deles e delas. Vivos só nas telas.
Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.