No geral, ainda que naquela jornada histórica, de vida e de conquista se vejam "mulheres de armas", a mulher aparece sempre (ou quase sempre) ligada aos trabalhos domésticos, à gestão do lar e educação dos filhos (se constituiu família), aquela que vê partir o pai dos seus filhos na esperança que ele retorne e traga nos alforges a promessa brilhante e amarela de uma vida melhor para ele e para ela. Isto a par daquelas que animam os saloons e recebem, com movimento, cor e vida, autêntica ou fingida, os forasteiros que buscam fortuna, zaragata, bebedeiras e sexo.
Retirando as excepções, estas minhas considerações sobre as horas que passei a ver "cawboyadas", a ver estes "CLÁSSICOS DO OESTE", apesar de todos eles me fazerem retornar à minha juventude, aos tempos de projecionista que fui, em TETE, aos tempos distantes do passado, não me desligaram do tempo presente e de tudo o que ultimamente tem vindo a público envolvendo realizadores de cinema e gente famosa ligada a essa indústria.
Refiro-me às acusações de ASSÉDIO SEXUAL amplamente difundidas nos canais das TEVs e nas redes sociais. E direi que, no filme CLÁSSICO DOS CLÁSSICOS, que, em DVD enriquece a minha videoteca - «ACONTECEU NO OESTE» - por oferta do meu filho Valter, com a saborosa dedicatória de «UM CLÁSSICO PARA OUTRO CLÁSSICO», em muito maus lençóis estaria o simpático pistoleiro Cheyenne por causa de, no momento da despedida, apalpar o cu à apetitosa Cláudia Cardinale. (Ver foto)
Uma obra de arte, seja qual for a forma que revista, é sempre para mim um despertar de conhecimentos, emoções, memórias e reflexão. Estes dois protagonistas são, para mim, bem dignos de simpatia e consideração.
Carregando, cada qual, às suas costas o pesado fardo do passado, como não ver em ambos a réstia de humanidade que não foi apagada na travessia dos agrestes trilhos da vida que tiveram de atravessar até se encontrarem?
Ela a deixar a buliçosa vida que levava na cidade de Nova Orleãs e se dispôs a ir para o campo e dar uma ninhada de filhos ao homem que, num encontro de ocasião, com ela casou e lhe prometeu vida diferente? Ele, Cheyenne, com aquela barba hirsuta, homem perseguido, rápido no gatilho, dotado de engenho e manha, filho de prostituta, a ver nela uma "grande mulher", a fazer-lhe "lembrar a sua mãe", o "bom café" que ela fazia, tudo dito com um olhar indecifradamente ternurento e paternalista, sem o mais pequeno gesto de agressividade ou de aproveitamento, mesmo que ela o tenha pensado e sugerido?
E "ternurento e paternalista" foi também quando, no seu último encontro lhe disse que nem ele, nem o amigo de ocasião (Charles Bronson) eram homens para ela. Ambos eram andarilhos, atreitos à aventura e não para ficarem presos ao chão. Que tivesse sorte na novel cidade que todos ajudaram a nascer, e que se algum dos trabalhadores lhe apalpasse o rabo, enquanto ela lhes dava água, que "fizesse de conta", que "não levasse a mal", pois eles mereciam.
Pois. Mas de fosse hoje, atendendo aos ventos que por aí sopram, SÉRGIO LEONE pensaria duas vezes em manter no guião tais palavras e tal gesto. Ou manteria?