PRIMEIRA PARTE
Nas minhas pesquisas não tive acesso ao documento no qual foi lavrada a INSTITUIÇÃO DO MORGADO, aqui referido, de Rangel de Carvalho, mas o direito sucessório nele instituído, vigente à época, não seria muito diferente de outros que me passaram pelas mãos, nomeadamente, o MORGADO instituído a favor da CAPELA DE SANTO ANTÓNIO, na vila de CASTRO DAIRE, texto que publiquei no livro «Castro Daire. Capela de Santo António» do qual transcrevo para aqui, por conveniência da narrativa, o seguinte respigo, relativo à ordem sucessória e administração do morgado, após o falecimento do instituidor, o abade de Castro Daire, Sebastião Rodrigues do Amaral, que era assim:

«Primeiro «o filho mais velho, e não tendo filho nem filha, o herdeiro mais chegado, preferindo-se em igual grau o varão à fêmea», imposição acrescida da seguinte advertência: «não ser judeu, cristão-novo, mouro, mourisco, negro, nem mulato, nem ter raça deles, mas ser cristão velho e de sangue limpo de cristãos velhos e honrados».
Voltarei a este assunto mas deixemos, aqui e agora, também o retalho que transcrevi de outro TESTAMENTO, desta vez de Sebastiana da Graça e marido Marcos Viseu, que publiquei integralmente no meu livro «Afonso Henriques, História e Lenda», encontrado nos arquivos de Castro Verde. Assim:
Os bens móveis e de raiz que constituíam «um morgado perpétuo para enquanto o mundo durar e nunca poderão ser nenhuns destes bens vendidos, nem alienados, nem obrigados, nem aforados, nem vendidos em vidas, nem danificados, nem descambados, nem obrigados a fiança ainda que para qualquer coisa destas se haja Breve de Sua Santidade ou Provisão de Sua Majestade e para poderem fazer qualquer coisa destas ou trocar uns por outros, porque assim é a última e derradeira vontade deles testadores que se não possa dispensar contra ela coisa alguma porque querem que se cumpra o que neste seu testamento têm declarado e é sua vontade que se não arrendam por mais tempo que nove anos».
SEGUNDA PARTE
Perguntarão porque me dei ao trabalho de transcrever estes dois respigos de textos que publiquei em livros, extraídos que foram de manuscritos inéditos, referentes ao «direito sucessório e administração» dos morgados instituídos, um em Castro Verde e outro em Castro Daire. Ainda não adivinharam? Eu dou uma ajudinha encostado ao bordão de Philippe ARIÈS, in «A Nova História» de Jacques Le Gof, et alii. Edições 70, 1978, pp31:
«Uma das características da História Nova é a de estar ao mesmo tempo e igualmente preocupada com o passado, mesmo o mais longínquo e com o presente mais imediato».
Já chegaram lá? Não? Então eu digo. Neste nosso tempo presente, de atmosfera irrespirável pelo alarido que por aí anda sobre a IGUALDADE DE GÊNERO, no Parlamento e fora dele, neste nosso tempo, de vozes troantes em defesa dos valores pátrios e da «pureza» de «raças e credos», com gladiadores «prós» e «contras», de ambos os lados, não há como olhar para o «passado» e tirar dele as lições que se impõem.
E vimos que António L. C. Rangel era casado com Filipa Sousa Bravo de Meneses, de cujo casamento nasceram 10 filhos entre os quais, António Lopes Bravo Pais de Menezes que, tal como o pai, foi capitão-mor de Castro Daire, cavaleiro da Ordem de Cristo e Familiar do Santo Ofício. E filha dele foi também Ana Maria Pereira Bravo de Menezes, (ou Ana de Lima Pereira de Menezes) herdeira do morgado de Castro Daire e das Santas Chagas em Braga com capela na Igreja de Santiago daquela cidade. Senhora que em 1706 casou com José Teixeira Rebelo Cardoso de Aguilar, podendo concluir-se, assim, que os «Aguilares» se tornaram proprietários em Castro Daire, por via do casamento com a herdeira do morgado de Castro Daire instituído por LOURENÇO RANGEL DE CARVALHO.

Bem, face ao dito e acontecido, a HISTÓRIA ajuda a esclarecer o papel da mulher na sociedade e o relego das ARMAS de RANGEL DE CARVALHO para lugar mais recatado com destaque para asARMAS dos Aguilares. E isso mostra bem como o património herdado por uma senhora de Castro Daire, pelo simples facto de ter casado com um senhor de fora, por força do «direito sucessório» acima referido, se perdeu nos escaninhos da história. Lembremo-lo, pois nunca é demais para acicatar a memória de alguns «patriotas» que por aí «berram» a defender a nossa HISTÓRIA, os nossos valores e as nossas gentes. Assim, fresquinho, como se fosse agora mesmo tirado do frigorífico:
Primeiro «o filho mais velho, e não tendo filho nem filha, o herdeiro mais chegado, preferindo-se em igual grau o varão à fêmea», imposição acrescida da seguinte advertência: «não ser judeu, cristão-novo, mouro, mourisco, negro, nem mulato, nem ter raça deles, mas ser cristão velho e de sangue limpo de cristãos velhos e honrados».
Posto o que, dito que foi haver TRÊS BRASÕES e eu ter mostrado apenas dois, aqui deixo agora o terceiro, datado de 1815, cujos elementos heráldicos diferem dos dois brasões anteriores. Esteve ele muito tempo pendurado na Igreja Matriz de Castro Daire, junto ao Altar das Chagas, ao lado do nicho onde está atualmente a imagem de Nossa Senhora de Fátima, e fotografei-o com autorização do Senhor Antero, exposto que estava no Salão principal do SOLAR. (cf. meu livro «Castro Daire, Igreja Matriz», publicado em 2013, edição do Notícias de Castro Daire».
E como também referi as relações estreitas que havia entre a família Aguilar e o Padre Bizarro, remato com um manuscrito que este recebeu de D. José de Aguilar, na altura nas sua terra de Origem - Cedovim - donde escreve a 26 de abril de 1717, sobre a venda dos cereais, aqui, em Castro Daire, com a recomendação de «nada de fiado».