Os nossos diferentes campos ideológicos não fizeram de nós inimigos, antes pelo contrário. Duas pessoas civilizadas, tratávam-se por «colegas», pois ambos estávamos ligados à docência. Raras vezes nos encontrávamos, pois, CABRIL, para quem não saiba, sendo parte do concelho de Castro Daire, fica no cabo do mundo, constituído por diversas povoações. Mas todas as vezes que ele vinha à vila, nos seus afazeres políticos e outros, falávamos das coisas que interessavam ligadas à nossa terra, quer políticas, quer culturais. De falas mansas e afáveis, foi para mim um prazer tê-lo por colega e amigo. Já não nos víamos há um bom par de anos.
Faleceu recentemente. Soube disso através da «NOTA DE PESAR» que o PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA, publicou no seu mural do FACEBOOK, cujo conteúdo tem inteiro cabimento neste meu espaço online. Faço-o com o misto de gosto e de pesar. Gosto, por lhe disponibilizar este meu espaço (não é para todos) e redobrado pesar pela perda de amigo. Assim:
«NOTA DE PESAR PELO FALECIMENTO DO PROFESSOR JORGE TELES
O Partido Social Democrata de Castro Daire, a comissão política e militantes, recebeu com profunda tristeza a notícia do falecimento do Sr. Professor Jorge Teles, um humanista convicto, um cidadão que, anos e anos, se empenhou, não se poupando a esforços nem a despesas pessoais, na promoção da terra, na divulgação da nossa cultura presidindo, durante décadas, ao Rancho Folclórico de Santa Maria de Cabril, tendo um papel decisivo na sua projeção regional, nacional e internacional, deixando uma herança que é um desafio para as gentes do presente e do futuro da freguesia de Cabril.
Com o falecimento do Sr. Professor Jorge Teles parte um Homem bom, com um profundo sentido de família e alguém que deu um contributo para a democracia e para o bem-estar da sua comunidade através da Casa do Povo de Cabril.
O concelho, a freguesia de Cabril e a cultura ficam mais pobres com a partida do Sr. Professor Jorge Teles. Fica-nos a riqueza do seu exemplo.
A Comissão Política Concelhia do Partido Social Democrata lamenta esta partida tão precoce e apresenta o seu profundo pesar a toda a família.
Castro Daire, 7 de abril de 2020
Logo que li esta «nota de pesar», datada de 7 de abril de 2020, ditou-me a consciência deixar o COMENTÁRIO que se segue, também aqui transcrito, na íntegra, para depois acrescentar algo que não tinha cabimento fazê-lo ali, naquele espaço.. Assim:
«Abílio Pereira de Carvalho Só por esta via soube do seu falecimento. E, neste momento, quero deixar aqui o meu testemunho acerca do seu interesse e empenho na vida cívica e desenvolvimento da nossa região. Sempre o tive por amigo e ele um dia, sabendo-me envolvido na investigação da HISTÓRIA LOCAL, solicitou-me um trabalho que PROVASSE que João Rodrigues Cabrilho era natural do nosso concelho. Procedi às pesquisas necessárias e foi DESCONFORTADO que ouviu o resultado delas: eu não encontrei DOCUMENTAÇÃO bastante que fundamentasse esse seu desejo. E sem DOCUMENTOS eu não arriscava tal afirmação, nem corroborava o que oralmente se diz a tal respeito. Mas fiquei-lhe agradecido pelo trabalho de que me incumbiu e mérito reconhecido para isso».
Posto isto, e para fundamentar o apreço mútuo que tínhamos, vou juntar algum material dos MEUS ARQUIVOS, algum do qual, não fora o seu interesse pelo desenvolvimento e conhecimento da NOSSA TERRA, não fosse ele convidar-me a estar presente, no encontro dos Ranchos Folclóricos que tiveram lugar na povoação do MOSTEIRO, em 1995, e eu não teria as fotos que hoje aqui publico, tiradas nesse dia com a minha MINOLTA carregada com rolo de 35mm. A foto digital era coisa do porvir.
E mais. Foi com a sua prestável colaboração que subi pela primeira vez à Tulha Nova, Tulha Velha e outras povoações vizinhas, incluídas num vídeo que fiz em 2017, alojado no Youtube, que colocarei no rodapé deste apontamento. Não foi feito a pensar, especificamente em si, mas a narração que nele faço não o exclui «da gente de trabalho e conquistadores da serra». Bem ao contrário.
Prestável me foi também a sua colaboração, nesse ano de 1995, aquando da minha investigação sobre a «ARQUEOLOGIA INDUSTRIAL» naquele projecto de «investigação aplicada» que levei a cabo durante a minha «licença sabática», enquanto professor da Escola Preparatória de Castro Daire.
Ele me indicou os equipamentos arqueológicos da fregusia que podiam ficar registados para a História. Restaurados ou não, logo se veria. Importava era inventaria-los, registar o seu estado de conservação, e deixar aos nossos vindouros algo que lhe mostrasse como foi a nossa «Indústria, Técnica e Cultura».
E mais uma vez de MINOLTA em punho,registei em película a foto daquele moinho «picarnel» sito na povoação de Vila Maior. E tanto quanto sei, já não existe. Valeu a pena a conjugação de esforços, meus e do meu colega Jorge Teles.
E como se isso fosse pouco, os meus arquivos dizem algo mais. Em 2004, por indicações suas, coadjuvadas por outro cidadão natural do Mosteiro, Dimas Duarte Teixeira Pinto, então com 57 anos de idade, desloquei-me ao outeiro onde dizem ter existido um reduto amuralhado pertencente «CIVILIZAÇÃO CASTREJA», semelhantemente às «MURALHAS DAS PORTAS DO MONTEMURO», da «MAGA» (arredores de Mões), S. LOURENÇO (arredores de Moledo) e Castro Daire incluso.
Nesse ano, depois de tomar uma bebida que Jorge Teles, hospitaleiramente me ofereceu num Café existente na povoação do Mosteiro (creio que pertencia a um familiar seu), desci às bordas do Paiva e observei aquele outeiro de forma cónica, rodeado pelo rio, exceto pelo lado que liga à povoação do “Crasto” onde restam alguns vestígios de um velho reduto castrejo..
E disso rezam os meus arquivos digitais e analógicos o seguinte:
«Dizem que no sopé do outeiro, lado sul, um velho lavrador passou anos a surribar o terreno e a fazer socalcos com vista a angariar o melhor sustento. De repente passou a ter uma vida desafogada e a ser conhecido pelo “Libras”. Ao apelido ligava-se a crença de ele ter encontrado “uma púcara de libras” durante os trabalhos da surriba.
Dizem também que ali perto existia uma fresta na qual quem entrasse jamais saía a não ser que levasse vestida uma peça de roupa com a qual “tivesse ido à missa”.
Para além do «dito popular» impresso na literatura oral, através de gerações, importante é sublinhar a localização do velho “crasto” no topo de um outeiro de forma cónica, junto a um rio, tal como Castro Daire. Importante é sublinhar a passagem do topónimo à povoação que ali existe atualmente. E a analogia impõe-se de imediato: se ao lado do velho “crasto” em ruínas, com vida em tempos remotos, existe hoje a povoação do “crasto”, por que não aceitar que Castro Daire, sob pena de se negar a sua certidão de idade, se tenha desenvolvido em torno ou na vizinhança de um velho “crasto” cujas pedras terão sido aproveitadas para os fins que a tradição oral e escrita regista?
E convém ter presente que, independentemente das diferentes grafias com que o topónimo aparece manuscrito ou impresso nos documentos, bem ao gosto e ao saber de gente letrada ou semiletrada, as gentes do povo, analfabetas ou semianalfabetas, da mais remota à mais próxima povoação do concelho, sempre se mantiveram fieis ao velho topónimo, dizendo “crasto” todas as vezes que se referiam à sede do concelho. Isto até aos fins do século XX com penetração no século XXI. Só as novas gerações escolarizadas poderão fixar a grafia e a pronúncia “Castro” vem vez de “Crasto” como faziam os seus pais e avós».
Em 2005 voltei ao velho «crasto» de Cabril e são dessa data as fotos que ilustram este apontamento.
Todos estes dados foram agora coligidos e aqui publicados em MEMÓRIA de um HOMEM que, em vida, fez o favor de ser meu amigo: JORGE TELES.
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