Teve de ser.
Pois se eu pensava e escrevia, que melhor ferramenta haveria para isso do que uma máquina de escrever e através dela extroverter o que eu pensava e sentia?
Tudo tem um fim, uma meta. Antes dela, e comparsa dela, foi a caneta. Companheiras de vida (antes delas foram a enxada do cavador, o cajado de pastor, a aguilhada do lavrador) e foi, seguramente, com dor (se às coisas atribuirmos sentimentos e afetos, tal como a gente) que a Oliva se viu substituída pelo computador.
Virou peça de Museu.
Com honroso passado (como tudo o que é meu) do seu teclado, batido pela minha esposa e filhos, saíram requerimentos, livros, etiquetas, exigidas e ditadas pelos pensamentos e metas traçadas. Saíram trabalhos estudantis, testes escolares, liceais, estudos universitários, conteúdos vários, destinados aos currículos profissionais, ou a serem publicados, destinados às investigações e estudos dos demais pares das CIÊNCIAS SOCIAIS, neste campo de batalha em que labuto.
E à vista estão estes livros, produto que saiu do seu teclado. Uns sem capa, outros com capas de aspeto desgastado, miolo lido e consumido, em parte desaparecido, vê-los assim, é um estímulo a prosseguir o caminho de lenhador na floresta das letras e nela, de podão em punho, continuar a abrir trilhos, caminhos e, sei lá, algumas clareiras de curiosidade, esclarecimento e conhecimento. Mesmo que, à semelhança das trutas do rio Paiva, nade «contra a corrente». Não faz mal. Vale mais só do que em más companhias.
Vê-los neste estado, aspeto desgastado, é um privilégio. É ter a certeza visual, sem estatística numeral, que foram muito manipulados, lidos, usados, consumidos, por clientes locais ou forasteiros que, de passagem por Castro Daire, pelo FORNO DA SERRA, levaram algo mais do que as especialidades da casa: pão e doçaria.
Tudo por que um dia, um ex-aluno meu, António Pinto, filho do empresário de panificação, senhor Narciso Pinto, se deu ao trabalho de fornecer aos clientes do estabelecimento, não apenas produtos de alimento físico, mas também produtos do conhecimento, alimento do espírito.
Tudo isto também porque um dia, há muitos, muitos anos, eu fiz poesia e com o dinheiro recebido, corri a comprar a OLIVA, esta máquina de escrever que, no cantarolar do seu teclado, deu forma, peso e medida aos pensamentos e afetos para os quais ainda não foi inventada balança, diferentemente da métrica.
Sem quezília, digo eu, é uma estimada peça de museu, uma autêntica
relíquia de família.