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sábado, 27 janeiro 2024 16:06

CASTRO VERDE - TERRA E GENTE (4)

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CASTRO VERDE - TERRA E GENTE (4)

No livro que dei à estampa com o título “HISTÓRIA DE UMA CONFRARIA (1677-1855), (sobejamente conhecido) a partir da página 61 exemplifico as suas funções bancárias da CONFRARIA DE S. MIGUEL, a partir dos CAPITAIS advindos das ESMOLAS dadas em espécie e, depois, converidas em DINHEIRO, nos respetivos LEILÕES feitos com “pregão” municipal  prévio, nos locais do costume, incluindo nos “montes” e terras em redondo, por forma a que a concorrência de interessados, mais fizesse render o produto leiloado.

 

CONFRARIAE não pensem que os “OFICIAIS DA CÂMARA”, v.g. as “JUSTIÇAS DA TERRA” que vimos serem nomeadas por SUA MAJESTADE FIDELÍSSIMA tinham a vida facilitada na gestão das ESMOLAS e correspondentes quantitativos de CAPITAL e de JUROS.

É que todo o CAPITAL saído dos cofres da CONFRARIA só podia sê-lo, depois do DEVEDOR deixar no cofre do CREDOR uma ESCRITURA DE HIPOTECA, onde de descrevia, de forma circunstanciada, o CAPITAL emprestado, os JUROS a pagar, o TEMPO do empréstimo  e o cumprimento assumido a contento das partes envolvidas.

E vem a propósito lembrar um episódio que se liga a esta minha investigação. Ele  bem pode servir de exemplo e de incentivo  à juventude dos nossos dias ou a todo aquele que se dispõe a pisar os trilhos da HISTÓRIA e penetrar no ignorado passado histórico, longínquo ou próximo.

Foi assim: ao tempo dessas minhas pesquisas em Castro Verde os manuscritos estavam ARQUIVADOS na SANTA CASA, na CÂMARA MUNICIPAL e no espaço que fica atrás do ALTAR-MOR DA BASÍLICA REAL. Todos os responsáveis por essas INSTITUIÇÕES me deram CARTA BRANCA para poder usá-los como bem entendesse. E sabendo-me docente na vila, casdo com uma senhora natural da terra, com família no meio, minha colega de profissão,  de seu nome MAFALDA DE BRITO MATOS LANÇA CARVALHO,  depositaram em mim toda a confiança no seu manuseamento. Atitude pela qual ainda hoje lhes estou grato. 

Um dia, estava eu na minha tarefa a procurar material atinente ao objectivo da minha pesquisa e dou com um “molho” de manuscritos cintados e na cinta, escrita a lápis, seguinte nota: “sem interesse”. 

Ora como a mim tudo interessava, abri o molho e dou com uma série abundante de ESCRITURAS DE HIPOTECA relativas aos DINHEIROS EMPRESTADOS A JUROS, saídos do COFRE DE S. MIGUEL. Conclusão: aquilo que o investigador que me precedeu considerou “sem interesse” foi para mim um manancial de informação que muito enriqueceu o trabalho que eu tinha entre mãos e acabei por verter em livro, como é sabido.

Não vou “fazer chover no molhado” e dizer aqui o que já ficou nesse livro, mas há pormenores que ficaram no meu ficheiro que talvez valha a pena repescá-los, e publicá-los aqui, sempre com o objetivo de levar a nossa JUVENTUDE a interessar-se mais pela HISTÓRIA a partir das FONTES e gastar menos a polpa dos POLEGARES a rolar o tapete dos SMARTS e a engolir, sem degustar, tudo o que ali lhe servem. 

Desta vez boto mão ao “Livro de Contas de S. Miguel” de 1714 e sgs. Fls. 54r e faço uso do apontamento que tomei relativamente aos JUROS de 1724. Assim:

JUROS 1724Despendeu mais com o empréstimo de 300.000 reis dados a juros (4.1.1724) ao capitão Jorge Mestre Faleiro, morador no termo de Ourique,mandados dar pelos oficiais da Câmara da vila de Castro Verde, o Juiz Caetano Mestre e vereadores João da Lança e Belchior Afonso, da Portela e Manuel de Sequeira e o Procurador do Concelho João Varela, como consta da escritura que está na mão do depositário, dado a 5% por prazo de um ano, ficando os oficiais da Câmara obrigados ao dito dinheiro a juros”.

Instituição montada e a rolar nos oleados rolamentos político/administrativos e judicias da época, dou um salto para o ano da 1805, com o enfoque nos JUROS e FOROS  DEVIDOS AO s. Miguel. Mas desta vez extraio os dados do «Rol dos Rendimentos da Igreja do Arcanjo S. Miguel, dos foros, juros e rendimentos do ano de 1805» «[consta de 4 folhas cosidas e encontra-se metido solto no Livro “RECEITAS E DESPESAS de 1842/55]» Assim:

“Das 52 parcelas de débito de dinheiro a juros, as seguintes são dos Padres:

JUROS PADRESQUADRO I - JUROS

IDENTIFICAÇÃO

JUROS

Padre João da Palma Neves

300 reis

Beneficiado António Guerreiro Faleiro

5.000 reis

Padre João Batista Gago dos Ramos

4.000 reis

Padre Manuel Dias

2.500 reis

 

FOROES QUADRO II – FOROS

Padre Inácio Francisco (das casas)

2.700 reis

Padre Inácio Guerreiro (das casas)

2.700 reis

Esperança Mestre (foro da horta das Almoleias

5.000 reis

Manuel Mestre (das Piçarras do Meio

20 alqueires

João Mestre (do Alimo)

60 alqueires

João Mestre (de Santa Ana, termo de Ourique, Fontainhas

30 alqires

Capitão-Mor de Santa Luzia (renda da Courela de S.Miguel)

8 alqueires

Inácio Guerreiro, das Bicadas

3 alqieires

Vimos, nas crónicas anteriores que as JUSTIÇAS DA TERRA, aquando nomeadas e ajuramentadas com a mão direita sobre os Santos Evangelhos, obrigavam-se a fazer a JUSTIÇA em nome do MONARCA e a fazer registo em livro assinado pelas PARTES.

TEXTO-JULGAMENTONunca encontrei esses livros, mas admito que eles tenham feito parte da arca que existia nos PAÇOS DO CONCELHO e, consultados e inventariados por mim, de cima a baixo, os do fundo da arca estavam transformados numa massa compacta, tipo tijolos, incapazes de serem abertos e folheados. Na altura, e dada a confiança que em mim depositou o, então, Presidente da Câmara Fernando Caeiro, fiz o “milagre” de salvar e dar saúde a alguns deles. Levei-os para casa e, submetidos a uma “fonte de aquecimento” e “secagem” à distância, lá me permitiram abri-los, folheá-los e verter para fichas muito do seu conteúdo. Outros, bastantes, não tiveram igual sorte. Eram mesmo livros transformados em tijolos. Tal foi o desmazelos dos respomsáveis. Parece-me ter chegado em boa altura. Um «retornado». Deixo esta nota com vista a alertar os atuais responsáveis pelos ARQUIVOS e a cuidarem do PATRIMÓNIO que, uma vez desaparecido, não há MILAGRE de SANTO, nem FONTE DE MILAGRE que lhes valha e muito menos  a  boa vontade e saber humano que os faça ressuscitar.

Pena minha não ter encontrado os livros ligados ao JUDICIAL, pois por eles, tal como encontrei aqui em Castro Daire e publiquei no meu livro “JULGAMENTO” saber-se-ía a tipologia de crime mais frequente praticado numa comunidade rural como era a de CASTRO VERDE e a de CASTRO DAIRE. E melhor se encontrariam os elos identitários que unem o PASSADO e o PRESENTE, conceitos muito usados, talvez gastos demais, mas tão pouco esclarecidos e evidenciados. Atente-se só no vídeo que se segue e facilmente se concluirá que as «JUSTIÇAS DA TERRA», que tinham assento nas Cãmaras Municipais, ainda me permitiram falar com UM ADVOGADO QUE NUNCA FOI, mas como tal era considerado, só porque foi para isso arrastado pela mão de um possante «oficial de diligências». Ora veja-se:

 

ÂNGELO MOITA - ADVOGADO QUE NÃO ERA

 https://youtu.be/OrOFcTSgjLM?si=kKn7148U-jf26lV_

 

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.