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segunda, 17 março 2014 21:37

TRIBUNAL DE CASTRO DAIRE (9)

Escrito por 
DA FICÇÃO À REALIDADE

PARA UMA MELHOR JUSTIÇA (9)

4.6 - RESPOSTA ÀS EXCEPÇÕES E RECONVENÇÕES

Reconvenções aceites, alterado o valor da acção, processo sumário transformado em processo ordinário, o caminho está aberto para o Circulo Judicial de Lamego. Mas não antes do meu advogado, Dr. Aurélio Loureiro, em substancial articulado, ter dado a devida resposta às «execepções e reconvenções» assinadas pelo Maritíssimo Juiz da Comarca.
Desse substancial articulado transcrevo, apenas, os «pontos» mais significativos a tal respeito, não vá o leitor ficar com a ideia de que o meu mandatário não cumpriu os seus deveres profissionais, ou que o fez de forma incompetente. Assim:

«(…)

38- E também por desde logo, ter o A. Abílio e mulher tomado posse do mesmo, iniciando demoradas obras de deitar abaixo todo o seu interior e respectiva cobertura, deixando apenas as paredes exteriores, e voltar a fazer a placa do 1º andar, placa do segundo andar, divisões interiores, tecto, telhado, levantamento de algumas paredes exteriores, paredes interiores, etc. com passagem dos materiais velhos e novo pela dita eira,

(…)
49- Além disso, até pelo volume e custo das obras que fizeram na dita casa, com demolição, reconstrução e ampliação, transformando uma casa em ruínas numa moradia nova, acrescentaram logo a seguir à compra um valor muito superior, mais de quarenta vezes mais, àquele que o prédio tinha antes de tais obras e que pagaram pela sua aquisição.

(…)
56- Não havendo, por isso, qualquer transmissão de tal invocado direito de preferência, tanto mais que tal direito previsto no art. 1555 do CC. se refere ao proprietário do prédio serviente à data dos factos e não ao proprietário seguinte, vários anos depois.

(…)
60- Pelo que, também por essa razão não há qualquer direito de preferência.

 61- Além disso, constituiria o pedido formulado a esse respeito pelos RR. nas suas contestações manifesto abuso de direito, por exceder manifestamente os limites da boa fé, traduzindo uma pretensão desmesuradamente onerosa para os AA, sem qualquer contrapartida digna desse nome por parte dos RR, como pretende o R. marido em 27, traduzindo um verdadeiro esbulho e total enriquecimento sem causa por parte dos RR,

62- Na verdade, a existir direito de preferência, 25 anos depois, sobre um prédio antes em ruínas e depois totalmente transformado, reconstruído, e com a evolução dos preços que houve ao longo destes anos, não podia o direito permitir a pretendida aquisição por parte dos RR. senão pelo preço ajustado ao valor actual do prédio em questão, valor que teria sempre de ser agora calculado por meio de necessária perícia.

 63- Abuso de direito esse também por ir contra o princípio da segurança jurídica, por apenas depois de mais de 25 anos pretenderem exercer um direito de preferência relativo a uma compra e venda do conhecimento dos RR desde o momento da sua realização ocorrida antes mesmo deles RR. serem possuidores do prédio serviente.

(…)
68- Mas esse facto não foi negado pelos AA, que juntaram fotografias através das quais se pode verificar tais factos, assim como as próprias confrontações dadas à matriz e registo confirmam a confrontação do seu prédio a nascente com a via pública.

(…)
Tribunal-279- E, também quanto a nós, não poderá o disposto no art. 1551 do CC. ser invocado quando é pedida declaração de existência de servidão constituída por usucapião, mesmo que legal, uma vez que em tal situação a constituição da mesma já acontecera desde há 15 a 20 ou mais anos antes  desse pedido de declaração, não sendo a invocação desse direito de aquisição simultâneo à aquisição do direito de servidão, mas posterior.

(…)
87- Por outro lado, diferente entendimento levaria a permitir continuadamente ao dono do prédio serviente usar mão de um direito invocável a todo o tempo, obstruindo mesmo os efeitos da usucapião, a qual nunca poderia ser invocada sob pena de sobre quem a invocasse cair a obrigação de ter de se ver expropriado daquilo que é seu.

(…)
88- Isto é: em tais situações nunca nenhum proprietário dominante, mesmo que o fosse já há mais de 50 anos, poderia estar seguro de que havia já reunido os pressupostos da aquisição de servidão de passagem por usucapião, porque sempre que pedisse esse reconhecimento poderia ser confrontado com a obrigação de ter de “vender” o seu prédio.

89- Permitindo assim ao proprietário serviente escolher o momento de “proferir o ataque contra a propriedade do vizinho” bastando-lhe definir o momento oportuno para si e, nesse momento opor-se fisicamente à passagem e obrigar vir o proprietário do prédio dominante a tribunal pedir esse tal reconhecimento de um direito adquirido há mais de 20, 30 e 50 anos!

 90- Não cremos poder ser esse o entendimento do instituto da usucapião e do direito previsto no art. 1551 do CC.

(…)
Razões pelas quais devem os pedidos reconvencionais deduzidos pelos RR. nas suas peças processuais ser considerados totalmente improcedentes por infundamentados e por consistirem em pedidos manifestamente ilegais, ou, a não ser de se entender assim, deverão tais pedidos ser julgados improcedentes por traduzirem, neste momento, um exercício manifestamente abusivo dos direitos invocados, quer por excederem manifestamente os princípios da boa fé e da segurança jurídica, quer por tal reconhecimento não poder ultrapassar os direitos dos AA. sobre o prédio identificado em 1 da p.i. adquiridos por usucapião, oportunamente invocada, assim como por acessão industrial imobiliária, que igualmente se invoca, e que em qualquer caso de reconhecimento de tais direitos sempre o seu exercício teria de ser pelo valor actual do prédio dos AA. e não outro».

 Vemos assim que, no tocante às excepções e reconvenções os sinais de alarme tocaram nos autos  Foram levados convenientemente pela mão do meu mandatário. Não fizeram vencimento na apreciação do Meritíssimo Juiz da Comarca. Veremos, com o desenrolar do processo, e bem assim o seu desfecho, qual deles fez melhor interpretação da lei. E como a causa diz respeito a uma servidão de caminho para o logradouro e quintal da minha moradia, situados nas traseiras, logo veremos quem tomou a dianteira e escolheu mais ajustado caminho, se a beca, se a toga.

(continua) 

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.