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quinta, 03 março 2016 13:33

MANUEL LIMA BASTOS - MAIS UM LIVRO

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Nos fins de fevereiro, p.p. chegou-me à velha caixa do correio mais um livro de Manuel Lima Bastos. Mais um que ele  teve a gentileza de me oferecer e enviar com a costumada e amável dedicatória. Li-o com a avidez e o prazer com que li todos os anteriores. Desta vez tem o título «Mestre Aquilino, Caçador e a Gaitinha do Capador». 

Mais um, o oitavo, carpinteirado, apaixonada, paciente e sabiamente com a matéria-prima extraída dos soutos e carvalhedos plantados pelo Mestre Aquilino Ribeiro, o nosso (de ambos) escritor de eleição. E o que posso eu acrescentar mais ao que já disse sobre este louvável e incansável labor de Lima Bastos? O que me falta dizer para corroborar nesta sua tarefa de divulgação da obra e do nome deste escritor beirão que pôs em letra redonda a vida dos meus avós, dos meus pais e a minha própria vida?

 Porque já disse tudo, ou quase tudo, à falta de ideias novas, repesco para aqui e deixo entre aspas,  excertos de crónicas que rabisquei e publiquei no meu site Trilhos-Serranos,  relativamente a anteriores livros seus: 

Lima Bastos-Red«Lima Bastos, apostado no arejamento e na divulgação da obra do Mestre, palavras suas: «objetivo que persigo e hei de perseguir enquanto as forças não me faltarem»,  fez-me revisitar, com grande prazer intelectual,  esta obra de Aquilino Ribeiro, «A Casa Grande de Romarigães». 

Ora, pertencendo eu às duas grosas dos seus fiéis  leitores (...) sou um daqueles que tem beneficiado destas suas leituras, decalques e paráfrases, deste seu ler, reler, tresler, contar e recontar Aquilino,  bem dizendo ele que «uns tantos, de certo algum benefício colherão porque percebem destas podas ainda menos do que eu». E no que a mim respeita, digo que acertou em cheio, pois, em tais artes,  podador de tesoura romba me confesso (...) Por isso, digo já que, LB neste seu divagar pela obra do Mestre, neste seu contar e recontar as suas narrativas, neste seu trazer à tona dos dias as personagens, as paisagens, os aromas físicos e sociais aquilinianos adormecidos, com vista à sua reanimação, para lá da prosa escorreita a que ele nos habituou, salpicada com pitadas de ironia e de humor que só um sorumbático  incurável ou um condenado à forca sem esperança de ver estendida a corda da vida, se ficam indiferentes sem sorrir, sem achar piada, tempero literário este que me parece ser a marca genuína do seu estilo».

 E sobre o seu livro «Mestre Aquilino, a Caça e Uma Gaita Que Assobia», publicado em 2015:

«(...) Neste passo de descanso da caçada, é oportuno dizer que esta «obrinha» de Lima Bastos, como é seu hábito referir-se-lhe, é, tal como os demais, um trabalho meritório. Há muito tempo que eu esperava por alguém, quiçá um estudante ou um professor, que, numa licenciatura ou tese de mestrado, penetrasse no Kruger Park de Aquilino e, ali chegado, apartasse, em clareira visível, as espécies e as artes venatórias que ele deixou dispersas em toda a área de caça que calcorreou com espingarda e pena. E quem diz da caça diz da pesca e da culinária, seguindo o método de LB, v.g. recreando e/ou animando cenários, aqui e além de cunho próprio, ou usando método diferente, como seja transcrever, tão só, os  textos originais. Qualquer deles, fosse qual fosse o método seguido, era para mim bem-vindo, sendo certo, porém, que o método de LB nos prenda com comentários, explicações, achegas adicionais e com as pitadas de humor sempre indispensáveis numa roda de amigos que sofregamente desfazem a merenda, uma broa de milho fatiada aos bocados, um salpicão caseiro trinchado às rodelas, ao mesmo tempo que esvazia as vasilhas de branco ou tinto para ajudar a acamar no alforge interno tudo o que passou pelo estreito, depois de muitos quilómetros andados a calcar mato (...)»

 E mais:

«Peneirando e crivando a obra ficcionada de Aquilino Ribeiro, naquela sua saga de manter vivo um mundo morto (um mundo político, agrário,  social, venatório, económico e literário), naquele seu jeito para a culinária, tal como confessou numa das suas primeiras obras, arte agora reiterada, foi-se às «eiras» do Mestre, joeirou o produto da sua malha e confecionou um prato de caça e pesca há muito desejado por todos os adoradores de Santo Huberto (...)»

Neste seu oitavo livro, constato que, para deleite e comodidade minha,  LB prosseguiu essa a tarefa e, desinteressado, como confessa, de quase tudo o se vai produzindo em Portugal sob a capa de literatura, acomodado naquela sua reiterada postura de ruminante (palavra sua que faço minha) consolando-se em reler o Mestre,  repassou vários dos seus títulos, pôs a sua mira, o seu anzol e rede em tudo o que é caça e pesca com o fito de juntar num só livro, digamos que numa só banca de feira, todo o produto da caçada e da pescaria realizadas nos montes e nos pegos aquilinianos. Bendita trabalheira! 

E como gostava eu de o ver também a meter a pá nos caixotões do milho produzido por Aquilino e do granel metido na larga e comprida tulha arrancar e meter em escaninhos separados,  os alqueires, as quartas ou os celamins eróticos e hedonistas que ali jazem envergonhados e lá foram colocados não só por imperativo do escritor  deixar em letra redonda a realidade da vida, as virtudes e os defeitos da humanidade, mas também como notas provocatórias e críticas à hipocrisia social e moral vigentes, valores a que tão avesso se mostrou. Fez o que se esperava de um escritor, de um cidadão que se dizia «inteiriço como um bárbaro». Sim! Ai o que eu gostava disso, face aos prometedores e saborosos apontamentos que ele, LB, foi deixando aqui e ali, ao longo dos seus trabalhos. De todos colo aqui apenas aquele que se reporta ao galo que ele comeu na Lamosa, com arroz de cabidela. Olhem só este cheirinho:

«(...) Nesta altura, passados que foram uns anos largos sobre o holcausto do galaroz magnífico, imolado na ara da gula daquela dezena de insaciáveis devotos de Pantagruel, estou em crer que deixou, em inconsolável viuvez, as inúmeras huris  do serralho alpestre da Lamosa. Firmo-me na certeza de que, antes de ser liminarmente degolado (...) aproveitou a breve passagem pelo mundo para galar, à vara larga, quanto galinhame alpestre lhe passou por debaixo dos barbilhões (...)».

Ora diga-me cá o leitor amigo se, sob a mira e o laço de Lima Bastos, metido no Kruger Park de Aquilino, «amante hedonista dos honestos prazeres da vida» não caía caça e pesca de monta, digna de ser cozinhada com arroz de cabidela, molho de escabeche, estufado ou mil maneiras de colocar na mesa pratos de comer e chorar por mais? 

Aqui lhe deixo a sugestão, pois eu, sem arte nem jeito, já fiz o que pude a tal respeito no livro «O Homem da Nave, Devoto de Diana», seguramente a contragosto dos sacerdotes que pontificam no sinédrio aquiliniano.

E chegado ao fim do livro constato que LB, assume o términos da sua cruzada com este oitavo livro sobre Aquilino. Oito e «mais um que está na forja»,  surpreendendo-nos com o seu «bizarro costume de dar nove voltas em redor do lume, antes de adormecer ao borralho morno da pedra lar». 

Um remate para mim surpreendente, pois constato que para além de termos de comum o gosto de ler Aquilino Ribeiro, de ambos sermos ruminantes inveterados da sua obra (abro este parêntese para dizer que até não desgostei do qualificativo, pois antes artiodáctilos do que perissodáctilos. Antes cabritos monteses rebeldes ao tiro a usufruir a liberdade selvagem, antes touros bravos das lezírias a morrerem com bravura nas praças citadinas, do que cavalo ajaezado, domesticado e obediente  ao freio e às esporas do cavaleiro, do que burro de albarda ou qualquer outra besta vergada pelo peso das cangalhas que o almocreve das letras lhe põe sobre o lombo) temos, dizia eu,  também de comum o número NOVE metido na pele e ironia cabonde metida no pimenteiro da escrita. Ele a fazer e a temperar pratos gourmet, eu a temperar moelas para balcão de taberneiro.  

Dito isto, ignorando eu o «bizarro» hábito de LB dar «nove voltas em redor do lume, antes de adormecer»,  veja-se a reflexão que sobre tal número, em 21 de novembro  de 2015, deixei, cumulativamente nos meus trilhos-serranos.pt e na página do Facebook. Curiosa coincidência. Assim: 

«FACEBOOK 9

Esta é a nona vez que me refiro ao papel do Facebook. O Facebook é uma lição. E como é a nona vez, aproveito o momento para tornar público que o número NOVE me persegue. Nasci num ano 1939. Na tropa atribuíram-me o número NOVE. E o número NOVE é o número da minha morada. TRÊS NOVES se ligam assim à minha pessoa e, como nos ensinavam na escola primária, nas contas de somar, 3+3+3=9, FORA NADA, concluo que nada valem as reflexões e os posts que aqui vou colocando, no Facebook.

 Mas, convencido embora disso, porque, para mim, o «Feçebook é uma lição» não desisto de fazê-lo, de estar cá, não me vou embora, que mais não seja para fazer pirraça aqueles amigos que gostariam de ver-me calado e incapacitado de alinhavar duas letras. De resto, não pensa como eu Tresidder ao dizer que o número 9, «como tríade tripla, é um número sumamente poderoso na maioria das tradições (incluindo) o mundo celta. No misticismo representa a tríplice síntese da mente, corpo e espírito, ou de submundo, terra e céu. Era o símbolo hebraico da verdade, um símbolo cristão da ordem dentro da ordem, daí talvez a organização dos anjos em nove coros" (Tresidder, Jak, «Os Simbolos e o seu significado»).

E pensando melhor, porque é que eu hei de desvalorizar a tríade de NOVES que a mim se associa, se é o número 9 que comanda as NOVENAS, NOVE dias, NOVE voltas ao templo, NOVE crianças, NOVE vinténs, NOVE responsos, NOVE badaladas das TRINDADES, sei lá, «9x3=27, quem não pode, não promete», como se dizia na minha juventude e não havia campanha política, para prometer e não cumprir.

O Facebook é uma lição. E estava eu a ficar consolado com a importância simbólica do número 9 e da tríade ligada à minha pessoa, quando o "pensamento", que «é a mente em acção», como dizem na televisão, me fez inverter o número e em vez de três NOVES me aparecerem três 666 e, foi o diabo a sete, tudo voltou ao princípio, pois para todos os que estão familiarizados com a BÍBLIA logo veem que esse número 666 é a identidade da BESTA.

E por aqui me fico. Senão, em vez de besta passo a ser bestial ou mesmo um anjinho dos nove coros, com muitos «gostos», muitos «likes», muitas «vénias» e muitos «beijinhos».. 

Vejam lá ao que me levou a leitura de um livro! Venha lá o NONO, ó Dr. Lima Bastos.

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.