Trilhos Serranos

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quinta, 25 outubro 2018 09:00

MOÇÃO CRISTALINA

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POLÍTICA E POLITIQUICE

a) Passei anos a calcorrear as serras da Nave e do Montemuro, à caça. Atravessei veredas, carreiros e caminhos que, de ano para ano, os matos, em primeira linha as giestas, me impediam de prosseguir.

b) Vi abrir cafés nas aldeias serranas por ex-emigrantes que eram autênticos "centros de dia", nos quais os idosos passavam o tempo a jogar o dominó, as cartas e as damas.

c) Vi fechar esses mesmos CAFÉS, quando do Terreiro do Paço chegaram as obrigações dos seus donos terem "escrita organizada" e máquinas registadoras para controlo fiscal.

d) Cafés fechados, vi esses mesmos idosos sentados nas escaleiras das portas, cotovelos nos joelhos, mãos no rosto a cabecearem, dormitando ou a pensar na "morte da bezera".

e) Defendi que todo e qualquer comerciante, donos de tais espaços, dada a função social que exerciam e era visível aos olhos de toda a gente, DEVIAM SER ISENTOS de impostos. Ter um café aberto numa aldeia da serra era aliviar os CENTROS DE SAÚDES dos doentes, NA VILA MAIS PRÓXIMA e de poupar dinheiro em medicamentos.

f) Vi e combati a desertificação, defendi a regionalização, fui e sou contra a centralização, fui e sou contra este entornar de Portugal para o mar e cidades litorais.

g) Vi passarem pelo Ministério da Agricultura muitos ministros, alguns dos quais pisaram os mesmos terrenos que eu. Vinham "à caça" e combinados com os gestores da RESERVA, levavam cinta cheia de perdizes, mas nunca viram o que eu vi: os matos a tomarem conta de tudo e os velhos a ficarem sem os espaços que lhes alimentava os últimos anos de vida.

h) E vieram os fogos. E foi o "aqui d'El-Rei" a bradar contra a desertificação e abandono dos campos. E o TERREIRO DO PAÇO sentiu a necessidade de inverter tudo. E eis que uma ex-ministra da agricultura, agora na oposição, acordou, levantou a crista e viu o país a arder. Ela não tem nada a ver com isso. Os fogos devem-se à geringonça. E, de consciência tranquila, sem nenhum OPORTUNISMO POLÍTICO, sem aproveitar a TRAGÉDIA que atravessou o país de cabo a rabo, como eu atravessava os montes atrás do rabo das perdizes, apresentou no Parlamento a sua MOÇÃO CRISTALINA. Nada na manga. Somente a INDIGNAÇÃO dos PORTUGUESES contra os políticos que nos tem governado. Ela não tem nada a ver com isso.

Pois daqui, da serra, digo a essa SENHORA e a todos os outros SENHORES DA POLÍTICA E DA GOVERNANÇA, passada e presente: eu tenho a MINHA CONSCIÊNCIA TRANQUILA. Tudo o que escrevi e acima aludi anda por aí espalhado em tudo quanto é suporte de imagem e de escrita: jornais, Youtube, Facebook e no meu site pessoal "trilhos serranos".

E mais, num dos meus livros escrevi a seguinte blasfémia: "O FUTURO ESTÁ NO CAMPO" . Já lá vão alguns anos, mas parece que o tempo e a tragégia trazida pelos fogos, me vêm dar razão.




N.B. Posto no Facebook no dia 25-10-2017 e migraso hoje para este espaço.

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.