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sexta, 09 setembro 2016 15:26

A HISTÓRIA E OS QUE DELA GOSTAM - III

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MORGADO DE SANTO ANTÓNIO

Já vimos na «Escriptura de Esponsais e Dote para Casamento» de  D. Maria Amália Benedita das Neves, concelho de Sanfins, com António de Freitas Pinto e Sousa que este noivo, da sua parte, entrou no dote com o «vínculo e morgado de Santo Antonio, instituído na villa de Crasto de Ayre de que elle he administrador».

Já historiei, em livro próprio,  o «VÍNCULO E MORGADO SANTO ANTÓNIO» cuja posse e administração não foram pacíficas no seu percurso histórico, apesar do seu instituidor ter deixado bem clara a «ordem sucessória» do legítimo administrador e herdeiro.

Todavia os meus amigos, amantes da HISTÓRIA, não ficarão a perder nada se eu aqui repuser o essencial dessa instituição, essa e todas as que viriam a cair na alçada das leis reformadoras do liberalismo pela pena de Mouzinho da Silveira. Ele, Mouzinho, saberia bem porquê. Vamos a isso.

Santónio

Em 1593, o abade de Castro Daire, Francisco Rodrigues, dotou a capela de Santo António, da vila de Castro Daire, com foros e bens de raiz que deviam ser administrados pelo seu sobrinho e sucessor Pe. Domingos Rodrigues, com ónus de ali celebrarem missas semanais pela sua alma.

Em 1625 foi a vez do seu sucessor, abade Domingos Rodrigues, passar os bens e o ónus para o seu sobrinho, Sebastião Rodrigues do Amaral, também abade de Castro Daire, em cujo testamento, datado de 1663, arrolou uma vasta cópia de «terras», «campos», «lameiras», «vinhas» «linhares» e foros pagos em géneros, dentro e fora do concelho de Castro Daire.

Com tal cópia de bens o abade achou por bem instituir um morgado e foi o que fez, deixando como primeiro administrador o Dr. João Rodrigues de Almeida, que, por sua vez, em testamento, datado em 1698, acrescentou ao património herdado mais umas tantas propriedades.

 Não podia adivinhar o abade que os bens vinculados à capela de Santo António pelos seus antecessores e por si próprio, agora instituídos em morgado, haviam de dar origem à «demanda» judicial que se arrastou pelos tribunais do reino grande parte do século XVIII (dezoito) e ultrapassou o primeiro quartel do século XIX (dezanove).

Tal se deveu ao facto do Dr. João Rodrigues de Almeida, seu herdeiro, no testamento que assinou em 1698, não ter cumprido a cláusula testamentária que estabelecia a ordem sucessória, própria dos morgados, após o seu falecimento, que era assim: primeiro «o filho mais velho, e não tendo filho nem filha, o herdeiro mais chegado, preferindo-se em igual grau o varão à fêmea», e ao contrário, ter escolhido para universal herdeira e administradora do morgado uma sobrinha, D. Ana de Miranda de Almeida, que era casada com o capitão-mor de Farejinhas, Francisco Teixeira Pimentel, opção essa que foi contestada em 1713 por João de Freitas, primo da contemplada e filho da irmã do 1º morgado.

 O caso arrastou-se indefinidamente pelos tribunais e no testamento de Manuel de Freitas, descortina-se a razão do arrastamento. Com data de 1783 ali se diz que «mais nomeava todos os direitos ao vínculo da capela de Santo António, da vila de Castro Daire, a seu filho Manuel, porque suposto de se compor com aqueles senhores foi ele ser pobre e eles serem muito ricos e não ter posses para demandas tão graves».

 Confessando-se  «pobre»  e, por isso, incapaz competir na justiça com  «aqueles senhores (...) por serem muito ricos»,  o filho, Manuel de Freitas Pinto Sousa, prossegue com a ação, e apesar do pleito ter sido resolvido a seu favor, tendo mesmo tomado posse dos bens, a outra parte, mais poderosa, não desistiu e a demanda continuou. À sua morte, ocorrida em 1816, o pleito não estava ainda resolvido e é o seu filho, António de Freitas Pinto Sousa, miguelista confesso, é  que vai continuar a batalha judicial. (cf. meu livro «Castro Daire, Indústria, Técnica e Cultura» capítulo «Liberalismo», editado em 1995 e «Castro Daire, Capela de Santa António», editado em 2014)  

 

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Abílio Pereira de Carvalho

Abílio Pereira de Carvalho nasceu a 10 de Junho de 1939 na freguesia de S. Joaninho (povoação de Cujó que se tornou freguesia independente em 1949), concelho de Castro Daire, distrito de Viseu. Aos 20 anos de idade embarcou para Moçambique, donde regressou em 1976. Ler mais.