Trilhos Serranos


Nos fins de fevereiro, p.p. chegou-me à velha caixa do correio mais um livro de Manuel Lima Bastos. Mais um que ele  teve a gentileza de me oferecer e enviar com a costumada e amável dedicatória. Li-o com a avidez e o prazer com que li todos os anteriores. Desta vez tem o título «Mestre Aquilino, Caçador e a Gaitinha do Capador». 

Mais um, o oitavo, carpinteirado, apaixonada, paciente e sabiamente com a matéria-prima extraída dos soutos e carvalhedos plantados pelo Mestre Aquilino Ribeiro, o nosso (de ambos) escritor de eleição. E o que posso eu acrescentar mais ao que já disse sobre este louvável e incansável labor de Lima Bastos? O que me falta dizer para corroborar nesta sua tarefa de divulgação da obra e do nome deste escritor beirão que pôs em letra redonda a vida dos meus avós, dos meus pais e a minha própria vida?

 

Sem rádio, sem televisão, sem boletim meteorológico informativo, o serrano adulto dos anos 50 do século XX, servia-se do saber de experiência feito para adivinhar o tempo do dia seguinte. E se era um daqueles que tinha aprendido a ler fora da escola, a complementar essa sapiência, botava mão ao "Borda d'Água" ou ao "Seringador" para ver as mudanças de Lua e certificar-se  da melhor altura do ano para sementeiras, plantio ou enxerto de árvores.

NO MINÉRIO TRABALHAVA, TRABALHA...TODOS GANHAVAM SÓ EU NÃO GANHAVA NADA...


No pós-guerra a febre do volfrâmio não deixou as gentes da serra.
O meu pai, a viver em Cujó, negociava em minério e um dia, ao cair da noite, dois supostos amigos seus da vila de Castro Daire, vindos de Almofala, dado o adiantado da hora, diziam, pediram-lhe para pernoitarem em nossa casa. Outros tempos em que sendo as distâncias curtas, longas as tornavam os difíceis acessos, carreiros e caminhos existentes.

O meu padrinho de batismo era agricultor e negociante da gado. Chamavam-no João Caixeiro, mesmo que de apelido registado fosse Camelo. Casado com uma irmã de minha mãe, Maria Leonor, era um santo homem, baixinho, de bigodinho, estou mesmo  a vê-lo. Comprava e vendia vitelos e, por obrigação da tradição, vá-se lá saber as razões da dita, cada compra obrigava  a "beber a cabrita", modo de fechar, sem mais regateio, o negócio entre as partes, com ou sem "rachador" pelo meio.

«NO MINÉRIO TRABALHAVA, TRABALHAVA...»

Nestas minhas andanças nos trilhos serranos, digo, nos trilhos da vida, dei por mim nas Minas da Queiriga, concelho de Vila Nova de paiva.

O meu primo Manuel Carvalho Soares, sabendo-me interessado em tudo o que respeita à História e à vida, levou-me até lá, até aquele outeiro esventrado, esburacado, de portas abertas, abandonado. Aquele outeiro que, em meados do século XX, foi um formigueiro humano de trabalho e de sonhos.